segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A ESCOLHA DOS HOMENS e A PREPARAÇÃO PARA A CORRIDA (Estratégia 7)




Para definir como foi feita a composição das equipes de cada um dos exploradores, uso todo um trecho do excelente "O último lugar da Terra":


A última festa de aniversário de Scott, ainda na base.
Note o tamanho da equipe, que aqui ainda não está
completa na ocasião. Só nesta foto temos quase
dobro da equipe Amundsem.

"Na escolha dos homens, Amundsen e Scott seguiram linhas fundamentalmente diferentes: Amundsen apostava na agilidade e na mobilidade; Scott se amparava nos grandes números. Amundsen mantinha sua fé na equipe pequena, com coesão e simplicidade. Era por natureza um líder de pequenos grupos, tinha consciência disto e aferrava-se a seu oficio. Toda sua equipe de terra teria no máximo dez pessoas; Scott estava pensando em vinte ou trinta". (Hustford)
Amundsen levou uma equipe de especialistas em diferentes áreas e apenas isto. Em comum a habilidade nos esquis, a capacidade de fazer parte de uma equipe e o conhecimento da neve e das baixas temperaturas.


Equipe de Scott antes do embarque.
Muitos marinheiros
Scott levou um enorme grupo que incluía marinheiros, especialistas, estudiosos, mas principalmente homens dentro de uma estrutura de poder regida pelas regras da Marinha Britânica.

As equipes chegaram ao continente com algumas semanas de diferença. Scott vinha de uma etapa muito próxima com seu navio, já que havia partido da Inglaterra, mas feito uma longa parada em sua última etapa da Nova Zelândia, enquanto que Amundsen viera diretamente da Noruega em uma viagem que praticamente cruzou o globo.

Ambas as equipes montaram acampamentos fixos em terra e desembarcaram todo o material trazido nos navios. Os acampamentos ficavam a quinhentos quilômetros um do outro, sendo que o de Amundsen estava cerca de 118 quilômetros mais perto do Pólo que o de Scott, que preferiu voltar para o mesmo ponto onde os ingleses já haviam desembarcado várias vezes, no estreito de McMurdo.

Scott sabia que existia terra e bons pontos de desembarque mais perto do Pólo, entretanto tinha a intenção de usar a mesma rota já realizada e mapeada por Shackleton, assim como parte da estrutura já existente no local. Isto sem dúvida constituía uma vantagem estratégica, já que ele, diferentemente de Amundsen, sabia com detalhes todas as etapas e barreiras da rota escolhida. Shackleton havia atingido a Latitude 88 23'S. a apenas 156 quilômetros do Pólo Sul. Sua escolha pelo local mais longe do Pólo deveria, portanto ser amplamente compensada pelo conhecimento detalhado da maior parte da rota, ou pelo menos assim se acreditava. 

Scott escolheu como meio de transporte preferencial os pôneis. Como todos sabem pôneis não são animais naturais de áreas polares ou inóspitas em decorrência do frio. Pelo contrário, são animais bastante sensíveis ao frio quando comparados com os cães polares, ursos, focas, pingüins, gaivotas polares, etc. Os que Scott levou eram pôneis siberianos, com "alguma" pelagem extra, mas continuavam a ser animais com sérios limites para a região e o clima. Uma boa base para o entendimento das limitações estratégicas imposta pelos pôneis é pensar na sua alimentação, assim como no seu peso e centro de gravidade. Pôneis se alimentam de forragem, alfafa, grama, trigo, milho, grãos e gramíneas em geral. Nada disto existe no Pólo, logo se faz necessário levar junto com o pônei toda sua ração. Os cães por sua vez comem absolutamente tudo que esteja vivo, ou não, isto inclui peixes, focas, pingüim, couro congelado, cordas, excrementos humanos e outros cães. O pônei é entre oito e dez vezes mais pesado que o cão mais pesado. Um pônei pesa entre 225 e 360 kgs enquanto um Malamute-do-Alasca chega a 36 kgs e um Husky Siberiano a 27 kgs. Isto gera um problema para atravessar locais onde a casca de gelo sobre o mar ou sobre as fendas não suporta tal peso. Em caso de acidente nas muitas e profundas fendas no gelo, puxar para cima um pônei é muito difícil, tarefa para muitos homens ou outros pôneis. Finalmente ao perder um único pônei, se perde a tração de um trenó inteiro. Ao perder um ou dois cães pouco ou nada acontece. Os trenós de Amundsen iniciaram a jornada com 13 ou 14 cães cada (num total de 86) e retornaram com 6. 

O peso também faz os pôneis afundarem muito na neve, enquanto que os cães, além de afundar menos, têm o movimento das patas em curva na neve macia, permitindo melhor tração que os pôneis. Isto deveria ser obvio para todos, já que os cães eram "naturais" da região ártica.

Finalmente o centro de gravidade alto do pônei faz com que as viagens embarcadas sejam muito ruins para os animais, principalmente em mares revoltos como os que cercam o Pólo Sul. Ao mesmo tempo o centro de gravidade alto dificulta a ascensão a terrenos muito inclinados e escorregadios também algo a ser esperado durante a viagem ao Pólo.

Os tratores de Scott. Prova da falta de foco e
indefinição na estratégia. Provaram que podiam
congelar facilmente.
Scott apesar de apostar as fichas nos pôneis também levou cães, só que em quantidades não tão grandes quando Amundsen. E, para não "perder a viagem", levou também 3 pequenos e pesados tratores de neve para serem adequadamente "testados". Resta lembrar que tudo isto aconteceu em 1910, um período no qual os carros e motores em si eram algo muito, muito novo e pouquíssimo confiável, mesmo em condições urbanas normais, quanto mais nos pólos.






A escolha de Amundsen, difícil encontrar
uma foto da equipe sem os cães.
Amundsen levou quase 100 cães no navio. Eles haviam sido comprados "do melhor fornecedor de cães" do pólo norte, sim, isto existe ainda hoje, se bem que hoje o estoque é direcionado para corridas e não mais para explorações. Todos vieram treinados para puxar trenós. Na viagem de ida para a Antártica ele já sabia quantos machos e fêmeas gostaria de possuir no seu "plantel". Assim quando uma das fêmeas pariu em alto mar, matou os filhotes fêmeas e guardou carinhosamente os machos. Os cães ao entrar no navio já estavam divididos em "matilhas" cada uma com um tratador destinado para alimentar, limpar e cuidar dos cães. Como Amundsen sabia que os cães suportavam bem o frio, mas não a umidade, mandou preparar sobre o deck do navio um falso deck, que colocou os cães em posição mais alta em relação às ondas e borrifos, mantendo-os secos. 


Scott por sua vez descobriu em alto mar que os cães odiavam ficar molhados, mas pouco pode fazer, já que todos, não só os cães, estavam muito molhados pelas condições do navio, que eram precárias. Scott e sua expedição quase afundaram por conta de um sério vazamento no casco e do entupimento das bombas de escoamento, com uma semana no mar, tendo que parar para fazer reparos. Ao retornar para o mar quase afundaram novamente em uma tempestade. Já Amundsen sabia que teria que enfrentar tempestades e, portanto havia revisado pessoalmente o barco, que apesar de muito antigo, 18 anos na época da empreitada, fora totalmente reformado. Ele também havia feito um cruzeiro de algumas semanas com o navio cheio ou quase cheio para testar os possíveis problemas, que foram encontrados e corrigidos ainda antes da partida na Noruega e dentro do prazo previsto. Durante o restante do verão em 1910 cada uma das equipes, após montar suas bases fixas, tratou de fazer tantas viagens quanto possível para montar uma trilha onde fossem armazenados mantimentos para a viagem de "ataque" ao Pólo Sul, a ser realizada no início do verão seguinte. 

Ambas as equipes sabiam que era impossível levar todo o mantimento necessário em apenas uma viagem, direto e reto, ao Pólo Sul. O trabalho então era levar uma quantidade muito maior que o necessário para a própria sobrevivência em uma viagem inicial, até o ponto mais distante possível da base fixa, no rumo do Pólo. Uma vez descarregado o material a equipe voltava para a base para pegar mais e iniciar tudo de novo. Estas viagens para montagem de "acampamentos" ou depósitos eram uma aventura em si, com todas as dificuldades inerentes ao "ataque". 

Scott teve vários problemas com a utilização dos pôneis já na viagem inicial para a montagem de um depósito avançado. Ao final da viagem ele havia perdido boa parte dos pôneis devido ao frio "não previsto" e ao fato de uma parte da expedição ter acampado para pernoite em um canal de mar congelado, que durante a noite se descongelou. Os homens escaparam da morte certa pulando de um bloco para outro em meio a uma situação perigosíssima, mas nem todos os animais puderam ser resgatados. Amundsen fez mais viagens, carregou mais peso e chegou muito mais longe na direção de seu rumo que Scott nesta etapa. 

Ambas as equipes passaram o inverno em suas bases, se preparando para a viagem que teria início na primavera.

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